A difícil e quase inútil discussão filosófica com um marxista: um exemplo histórico

 Um marxista, ao debater, tentará enquadrar as ideias do outro dentro do conceito de ideologia traçado por Marx. 

As ideias que, na verdade, são a representação intelectual do objeto que foi apreendido pelos sentidos, serão tratadas como meras convicções de acordo com as relações de poder  historicamente e socialmente  estabelecidas. Ou seja, a classe dominante produziria uma consciência errônea dentro do contexto histórico e social de luta de classes. 

Assim, segundo um marxista, a classe dominante imporia a toda sociedade, através da ideologia, seus interesses de classe, que seriam os interesses de toda a sociedade. 

A consequência desse conceito de ideologia é que as ideias, mesmo as filosóficas, seriam exemplos de dominação ideológica. E se a discussão política, para obter bons frutos, deve se ater a parâmetros lógicos, muito mais ainda a discussão filosófica. 

Claro, a política é importante e traz com ela muitas lições para a humanidade, no entanto a filosofia vai ao cerne das coisas, alcançando uma profundidade que pode chegar ao âmago da existência. 

Por isso mesmo, a importância de delimitar aquilo que se vai discutir em filosofia. 

Em 1920, Karl Jaspers propôs um seminário sobre a concepção Kantiana de liberdade. Segundo Jaspers, foi ele interrompido por um estudante marxista que desviou o assunto e afirmou: “…Tudo isso não passa de ideologia burguesa.

Devemos tomar o pensamento de Kant como uma superestrutura – só assim é possível comprendê-lo”. Jaspers responde: “a concepção de liberdade em Kant está penetrada de uma inteligibilidade que se dirige ao homem como homem…” 

A discussão seguia e o estudante marxista não se atinha ao assunto proposto no seminário. As ideias Kantianas sobre a liberdade viraram um embate entre Marx e sua ideologia, representado pelo estudante, e Kant e suas ideias pelo Dr. Jaspers, o que levou este a dizer: “Queremos compreender essas ideias? [as ideias de Kant sobre a liberdade].

Cada um decidirá. É exigência que a ninguém se pode fazer. Mas não lhe parece que eu esteja no direito de supor que todo aquele que comparece a um seminário sobre Kant decidiu compreender suas ideias? Falamos de Kant não de Marx”. Ou seja, a atitude correta, por parte do estudante marxista, seria concordar ou discordar das ideias de Kant sobre a liberdade, não opor Marx e sua ideologia como tema, mas criticar dentro das próprias ideias sugeridas e de acordo com os parâmetros lógicos inerentes a uma discussão filosófica.   

guedesebraga

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