A SUSTENTABILIDADE E A SUA PROTEÇÃO PENAL: ANÁLISE CRÍTICA DA LEI Nº 9.605/98
A SUSTENTABILIDADE E A SUA PROTEÇÃO PENAL: ANÁLISE CRÍTICA DA LEI Nº 9.605/98
Autor: Ítalo Wesley Paz de Oliveira Lima[1]
RESUMO: O presente artigo centra o seu objeto de análise nas denominadas políticas ambientais, a sua evolução e na sua função de respostas do uperar a crise socioambiental que age no presente, e que põe em risco a qualidade de vida e a existência humana. Usando o método dedutivo, se utiliza de pesquisa em periódicos e em obras doutrinárias como forma de se alcançar os resultados e conclusões expostas ao fim. Partindo da ideia de uma crise socioambiental na sociedade de risco, se faz necessária uma análise dos mecanismos utilizados pelo ente estatal para contribuir na sua superação, se permitindo compreender e se direcionar para uma ação mais eficaz. As políticas públicas ambientais são os principais instrumentos do Estado para refrear causas da crise ambiental, por meio de uma ampliação de sua base cognitiva de forma a poder agir em várias frentes na contenção dessa crise não apenas socioambiental, mas igualmente econômica e política. Por último, cumpre destacar uma atenção especial para a evolução dessas políticas e a função promocional do Direito na seara socioambiental.
PALAVRAS – CHAVES: crise ambiental, políticas públicas, sustentabilidade
I – INTRODUÇÃO
A evolução da ciência e do consumo trouxeram ao ser humano um momento de bem estar inédito dentro da historia humana. Porém, todo esse bem se assentou na consumo excessivo de recursos ambientais, que levou a uma perspectiva de escassez dos bens da natureza. Este fato põe em risco a própria existência humana.
Ante esse quadro o Direito pátrio passou a realizar a tutela do meio ambiente ecologicamente equilibrado, elegendo-o enquanto aspecto essencial para a promoção da sadia qualidade de vida não apenas para as presentes, mas para as futuras gerações, inclusive por meio do uso da tutela penal, realizada pela lei nº 9.605/98.
II – METODOLOGIA
Com efeito, ao longo desse texto o método de pesquisa a ser utilizado será o dedutivo, tendo em vista o caráter teórico e crítico do resumo expandido.
A técnica de pesquisa foi a documentação por meio indireto, visto que será utilizada, em boa parte, a interpretação de textos. Algumas das fontes que serão utilizadas: a Constituição Federal, legislação infraconstitucional, livros e periódicos, alguns nacionais e outros internacionais. Por último, se dará uma abordagem crítica especificamente na parte da pena abstratamente aplicada aos crimes ambientais e a aplicação de institutos despenalizadores, que serão considerados como insuficientes para a efetiva proteção do meio ambiente. Em suma, se utilizou de método de procedimento bibliográfico.
III – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A essencialidade do meio ambiente para a promoção da sadia qualidade de vida do ser humano, da mesma forma que se mostra imprescindível para a concretização dos direitos constitucionalmente determinados, justifica a necessidade de se tutela penal do meio ambiente. Por esse fato, a Constituição Federal dispôs acerca do dever do Estado em promover a proteção do meio ambiente, determinado enquanto um direito fundamental a ser resguardado e usufruído, conforme o ensinamento exposto por Edis Milaré (2005, p. 844):
[…]Em outro modo de dizer, a ultima ratio da tutela penal ambiental significa que esta é chamada a intervir somente nos casos em que as agressões a valores fundamentais da sociedade alcancem o ponto do intolerável ou sejam objeto de intensa reprovação do corpo social.
Dessa forma, a Constituição Federal passa a dispor acerca da proteção de bens jurídicos de natureza difusa, inclusive, mediante o mandamento de criminalização expresso contido no art. 225, § 3º do texto constitucional de aplicação de sanções penais às condutas lesivas ao meio ambiente. Assim o texto constitucional se utiliza da fórmula do mandado de criminalização com vistas a conferir uma proteção superior ao meio ambiente, conforme esclarece Smanio (2002, p. 132):
A visão constitucional defendida hoje por inúmeros doutrinadores em todo o mundo nada mais é do que uma visão positivista, reconhecendo a criação do conceito de bem jurídico penal a partir das normas hierarquicamente superiores às demais, quais sejam, aquelas decorrentes da Constituição Federal.
Apesar de o texto constitucional consistir no marco da proteção ambiental no Direito pátrio, cumpre aqui ressaltar que a Política Nacional de Meio ambiente (lei nº 6.938/81), concebida ainda em um período histórico em que vigia um Estado de exceção, buscou realizar a submissão da economia a objetivos ecológicos e sociais, visando a reconstrução das práticas econômicas, foi o primeiro texto legal a realizar a proteção do meio ambiente, sempre calcado na lógica de antecipação à ocorrência dos danos ambientais, por meio do princípio da prevenção determinado no art. 4º, V e VI da lei nº 6.938/81.
Dessa forma, a Política Nacional de Meio Ambiente e a Constituição Federal traçam para o Direito Ambiental pátrio a imposição ao Estado e à coletividade, em tomar medidas antecipatórias de forma a evitar a ocorrência da degradação. É dentro desse contexto de prevenção aos danos ambientais que se insere a presente crítica na tutela penal do meio ambiente.
A lei de crimes ambientais (lei nº 9.605/98) se converte no principal diploma normativo para a tutela penal do meio ambiente. Concebida dentro de uma lógica de Estado Social de Direito, se propõe a superar as limitações relativas ao Direito Penal de índole liberal, para realizar uma proteção de bens difusos dentro de uma nova realidade, qual seja, a da criminalidade econômica, sem contudo se olvidar das garantias necessárias dentro de um Estado de Direito. Nesse aspecto, ensina Fiorilo (2012, p. 05):
Quando tratamos da análise da tutela penal do meio ambiente se faz necessária a verificação de alguns conceitos, como o de bem jurídico, o de delito e o de lesividade, pois serão eles, associados aos princípios da subsidiariedade e da fragmentariedade, que darão legitimidade à intervenção penal nessa nova era de pretensões jurídicas da qual faz parte o direito ao meio ambiente.
Essa assertiva reforça a lógica da proteção conferida pela Constituição Federal, que em seu art. 225 dispõe a lógica preventiva e a tríplice responsabilização (administrativa, penal e cível) do dano ambiental. A lei nº 9.605/98 traz inovações pertinentes com o espírito da novel proteção constitucional ao meio ambiente, a exemplo da possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica do infrator (art. 4º), a possibilidade de aumento da pena de multa segundo a vantagem econômica auferida pelo causador do dano ambiental (art. 18, segunda parte), bem como a necessidade de reparação do dano ambiental (art. 17).
À semelhança do que ocorre nas demais espécies de responsabilidade, a tutela penal do meio ambiente deve centrar seus esforços em se antecipar à ocorrência do dano. Na seara do Direito Penal, o principal instrumento de prevenção de novas infrações ainda é o instituto da sanção penal. Afinal, esse instituto, como bem assevera Hassemer (1993, p. 34):
(…) existe a esperança de que os concidadãos com inclinações para a prática de crimes possam ser persuadidos, através da resposta sancionatória à violação do Direito alheio, previamente anunciada a comportarem-se em conformidade com o Direito; esperança, enfim, de que o Direito Penal ofereça sua contribuição para o aprimoramento da sociedade.
Contudo, as penalidades elencadas nos tipos penais presentes na lei nº 9.605/98 se encontram em verdadeiro descompasso com a proteção ambiental atualmente requerida.
As irrisórias da lei nº 9.605/98 contribui para a ineficácia do caráter preventivo do Direito Penal Ambiental, na medida em que o ordenamento penal eficiente se faz da relação sinérgica e harmoniosa do caráter retributivo e do caráter preventivo da pena.
Ademais, não se olvida que penas irrisórias são impeditivos de aplicação do jus puniendi estatal, em virtude de aplicação de institutos despenalizadores na seara ambiental, notadamente a transação penal (art. 27), a suspensão condicional do processo (art. 28), a suspensão condicional da pena (art. 16) e finalmente a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos (art. 7º).
A presença desses institutos denuncia que o legislador infraconstitucional os desconsidera os danos da criminalidade ambiental (danos difusos e irreversíveis). Não se deve olvidar que a tutela penal ambiental não possui sintonia com as demais políticas públicas ambientais, prejudicando dessa forma que o ordenamento jurídico possa exercer uma proteção efetiva do meio ambiente.
Nessa esteira de pensamento, se encontra Guilherme Câmara (2006, p. 538), segundo o qual “o ordenamento-jurídico penal das nações comprometidas com o futuro da humanidade não pode prescindir de utilizar mecanismos aptos e eficazes à proteção de determinados bens jurídicos fundamentais.”
Aqui se relembra a lição anteriormente exposta por Norberto Bobbio (2004, p. 25), segundo o qual o mais grave problema dos direitos na atualidade não corresponde à sua justificação ou fundamentação, mas sim o meio de realizar a sua proteção, especificamente no que concerne a se conceber meios eficazes para torna-los exigíveis.
Nesse aspecto, as ponderações de Burgalho (2008, p. 397), em que a elaboração e aplicação do Direito Ambiental seja apoiada em uma minuciosa análise da realidade, reforçando a necessidade de se construir uma dogmática própria para o Direito Penal Ambiental, onde se possa elaborar um corpo legislativo devidamente preventivo, em consonância com as demais políticas ambientais.
IV – CONCLUSÃO
A tutela penal, a par de imprescindível para a proteção ambiental, a sua eficácia em resguardar aquele se encontra profundamente posta em dúvida, em virtude de que as penas cominadas para condutas lesivas ao meio ambiente não apenas desconsidera o mandamento do art. 225 da Constituição Federal, mas igualmente contribui para o descrédito do sistema penal ambiental e impossibilita a promoção do desenvolvimento sustentável.
Dessa forma, se faz urgente uma reforma das penas cominadas condutas tipificadas na lei de crimes ambientais (lei nº 9.605/98), de forma a promover um enrijecimento das penas e harmonizar a proteção ambiental com as demais políticas ambientais, otimizando dessa forma o caráter preventivo do Direito Penal Ambiental.
REFERÊNCIAS
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho; apresentação de Celso Lafer. — Nova ed. — Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. — 7ª reimpressão.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF, 5 de out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em: 27 dez. 2015.
BURGALHO, Nelson R. Sociedade de Risco e Intervenção do Direito Penal na Proteção do Ambiente. Congresso Internacional de Direito Ambiental. 12: 2008: São Paulo, SP, p. 397.
CÂMARA, Guilherme Costa. O direito penal secundário e a tutela das futuras gerações. In: D’AVILA, Fabio Roberto; SOUZA, Paulo Vinicius Sporleder de (coordenadores). Direito penal secundário: estudos sobre crimes econômicos, ambientais, informáticos e outras questões. São Paulo: Revista dos Tribunais; Coimbra, 2006. p. 215-243.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco; CONTE, Christiany Pegorari. Crimes ambientais. São Paulo: Saraiva, 2012.
HASSEMER, Winfried. Três temas de Direito penal. Porto Alegre: Fundação Escola Superior do Ministério Público, 1993.
MILARÉ, Édis. Direito Penal Ambiental. 1ª. Ed. São Paulo: Millennium, 2005.
SMANIO, Gianpaolo Poggio. A tutela penal constitucional. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 39, ano 10, jul./set. 2002, p. 132.
[1] Mestre em Direito Pela Universidade Federal da Paraíba.
Para ler sobre a decisão do STF sobre os quintos dos servidores públicos federais, clique aqui.
http://www.luizguedes.adv.br/