BRASIL, INSEGURANÇAS E IMPREVISÕES
BRASIL, INSEGURANÇAS E IMPREVISÕES
É bastante comum o questionamento acerca dos elevados preços dos produtos ofertados e dos serviços prestados no Brasil. Quando comparamos os mesmos produtos e serviços similares com os oferecidos em outros países, a constatação da disparidade de preços costuma ser impressionante. A internet é um bom instrumento para se fazer essas comparações. Dentre as diversas variáveis que compõem a formação do preço de um produto, ou de um serviço, estão os riscos envolvidos na produção e no fornecimento, que vão desde o procedimento oneroso, demorado e imprevisível de uma licença fornecida pelo ente estatal, entre elas as licenças para instalação e funcionamento de um negócio, até o percentual de inadimplência naquele setor. Um dos componentes do risco que costuma chamar a atenção de forma especial é a insegurança jurídica. Esta está presente no comportamento e na forma de pensar de diversos setores brasileiros. Alguns poderão afirmar que está enraizada na cultura nacional, que sempre foi assim e que provavelmente nunca mudará. Porém, elementos culturais podem ser modificados, aperfeiçoados.
O Estado brasileiro gera insegurança ao regular as condutas dos seus agentes e dos administrados com normas imprecisas e com margem alargada para o atuar discricionário, bem como quando não observa adequadamente o contrato social maior, que é a nossa Constituição Federal, sendo, muitas vezes, o primeiro a descumprir as normas constitucionais e legais. A população gera insegurança quando vários de seus componentes buscam formas de não cumprir os contratos celebrados, quer de natureza civil, trabalhista ou consumerista, bem como anseiam pelas “brechas” legais para obter algumas vantagens, cujo ônus dessa prática é compartilhado com a sociedade através de aumento de juros, já que aumenta o risco nos negócios. Os candidatos e partidos políticos judicializam o pleito eleitoral, criando o denominado “terceiro turno”, carreando insegurança e algum grau de imprevisibilidade para os mandatos dos eleitos, com reflexos negativos para a população. Alguns podem argumentar que vivemos na era dos riscos, que toda sociedade está inserida em um ambiente de tal natureza. Porém, o nível de risco e de imprevisibilidade não pode ser de tal monta que gere um sistema extremamente oneroso e penoso para a sociedade, como é o brasileiro atualmente.
Vive-se, no Brasil, o que os filósofos denominam de paralaxe cognitiva. O Estado e a sociedade apregoam a construção de um país mais justo, desenvolvido, voltado para a construção de uma sociedade melhor para as futuras gerações, porém, o idealizado, ou o propalado, fica no mundo das ideias, e, no mundo das ações, as práticas antigas, largamente combatidas no discurso, por serem consideradas prejudiciais à nação, são repetidas inúmeras vezes, diariamente, em prejuízo da maioria. Além disso, há alguns paradoxos, entre eles a propaganda do anseio do setor produtivo por mais liberdade regulatória, pró mercado, porém pleiteia do governo subsídios para o setor. A União Federal fez leilões das jazidas de petróleo do pré-sal para que a iniciativa privada explorasse economicamente tal recurso, porém obrigou a participação da Petrobrás (empresa estatal) como operadora única dos campos. A população critica a corrupção perpetrada por parte da classe política, porém alguns procuram um cargo comissionado no setor público justamente pela ideia de ter um emprego e não um trabalho, ou seja, pela ideia de que receberão uma boa remuneração sem precisar trabalhar em prol da sociedade (sinecura).
Tudo isso, somado, gera um sistema vicioso que onera a sociedade e o Estado, sem trazer benefícios; ao contrário, gera insegurança e falta de razoável previsibilidade, dificultando sobremaneira os investimentos necessários para o desenvolvimento do país. Sistema esse que só será aperfeiçoado quando se incutir na cultura do povo brasileiro e também nas práticas estatais a necessidade de cumprimento da Constituição Federal, das leis e dos contratos, possibilitando, assim, a construção de uma nação com credibilidade interna e internacional, tão necessária para o desenvolvimento sustentável do país por várias gerações, deixando para trás definitivamente a era do crescimento ilusório, sem bases sólidas.
Publicado no Jornal Contraponto em 03/06/2016.