Quais os benefícios da PEC dos precatórios?
Quais os benefícios da PEC dos precatórios?
A credibilidade é o atributo ou característica de quem ou do que é crível, confiável. É o resultado do cumprimento das obrigações legais, contratuais e morais por alguém (pessoa física ou jurídica). O mesmo se aplica aos países, tanto nas suas relações internas quanto nas externas.
As obrigações jurídicas têm como fundamento de validade o que está previsto na lei. E a legislação, como regra geral e cogente, deve ter um caráter de permanência ao longo do tempo. Isto é, as pessoas precisam saber a lei que rege as suas relações obrigacionais e que esta não é modificada ao longo do tempo por mero casuísmo.
É extremamente danoso para a credibilidade de um país a mudança na regra que rege as suas obrigações perante os credores internos e externos.
E por que estou dizendo isso? Em razão da PEC 23/2021, que será votada hoje (02/12/2021), no Senado, e que altera o regime de pagamento dos precatórios. Infelizmente, a maior parte da população brasileira não compreende o que isso resulta, muitas delas pensando que, por não ser credora de precatório, não precisa se preocupar com tal proposta de emenda constitucional.
Dito isso, como os potenciais investidores do Brasil entenderão o movimento do parlamento brasileiro em aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional que estabelece o novo regime de pagamento dos precatórios?
Antes de responder a esta pergunta, importante sabermos o que é um precatório. O precatório não nasce do dia para a noite. É o resultado da inscrição do crédito oriundo de ação judicial contra o ente público. Vale frisar que esses processos duram em média mais de dez anos, com prazos dilatados para o poder público em relação aos prazos do particular (pessoa física ou jurídica). Precatório é o instrumento de inscrição do crédito reconhecido em título executivo judicial transitado em julgado (sentença ou Acórdão) no orçamento do ente público (União, Estados ou Municípios).
Vale destacar que, depois de inscrito no orçamento, o pagamento não é imediato. Precisa obedecer à ordem de inscrição e à natureza do crédito. A União Federal, dos entes da federação, é (ou era) o único a pagar os créditos de precatório dentro do ano do orçamento respectivo. Estados e municípios têm uma lista enorme de precatórios em atraso.
A PEC 23/2021, que atualmente está no Senado, significará um adiamento ainda maior no pagamento dos créditos inscritos no orçamento da União, dos Estados e dos municípios, bem como cria limites para a inscrição de futuros precatórios.
Na prática, a PEC 23/2021 significará um adiamento do pagamento dos precatórios, que são dívidas reconhecidas judicialmente contra a Fazenda Pública, em detrimento dos credores, legítimos titulares do direito ao recebimento do aludido crédito. E tudo isso para que? Para burlar o limite imposto pelo “Teto de Gastos”.
Os defensores da proposta legislativa afirmam que a PEC 23/2021 é importante por uma questão social, para permitir o pagamento do benefício “Auxílio Brasil”. Porém, não dizem que o pagamento dos precatórios também é uma questão social, pois na lista de credores há milhares de aposentados, pensionistas e pessoas que têm algum crédito, de natureza alimentar, contra a Fazenda Pública. E esse crédito é oriundo do descumprimento do ente público da lei ou de algum contrato.
Há um substitutivo global à PEC, de autoria de Alessandro Vieira (Cidadania-SE), José Aníbal (PSDB-SP) e Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que em tese permitiria manter a regra do teto de gastos para o pagamento do Auxílio Brasil, pois retiraria do texto, excepcionalmente em 2022, das despesas com precatórios da regra do texto de gastos.
Não seria o ideal, porém resultaria no cumprimento da obrigação legal de pagamento dos precatórios pela Fazenda Pública.
Se precisa pagar o “Auxílio Brasil” sem estourar o teto de gastos, por que não diminuir o volume do Fundo Eleitoral?
No final das contas, o que fica claro é que a PEC 23/2021 permitirá que o ente estatal deixe de pagar os precatórios para utilizar o dinheiro em outras rubricas, mormente em ano eleitoral (2022). E não terá resistência da oposição, querem apostar? Ao contrário, deverá votar também de forma favorável à PEC, pois, no final das contas, deverá sobrar dinheiro também para as emendas parlamentares.
Se o cidadão não cumpre com uma obrigação legal, tem todo o peso do estado sobre ele, inclusive com poder de confisco. Se o estado não cumpre a lei (o que não é raro, ao contrário), tem todo o respaldo na legislação para só ser compelido ao pagamento da dívida décadas depois, após um longo e penoso processo judicial.
Voltando à pergunta inicial. como os potenciais investidores do Brasil entenderão o movimento do parlamento brasileiro em aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional que estabelece o novo regime de pagamento dos precatórios?
Esses possíveis investidores com certeza irão rever a estratégia de investir no Brasil, pois a PEC 23/2021 colocará um selo de qualidade no Brasil de péssimo cumpridor/observador das suas obrigações legais, o que gera tremenda insegurança jurídica. E é melhor para o investidor aportar seus recursos em algum outro país com mais segurança jurídica.
Além da desistência de investidores, haverá um aumento nos juros da dívida pública do Brasil, pois o país precisará pagar mais juros para atrair pessoas interessadas em comprar títulos da dívida pública brasileira, em razão dos riscos envolvidos, em especial dos riscos jurídicos.
Você emprestaria dinheiro para algum conhecido seu que é conhecido na praça como caloteiro? Com certeza não. Algo parecido acontece entre países.
Além de ter de enfrentar uma crise mundial que se avoluma, o Brasil terá de enfrentar ainda uma crise de confiança, que é muito mais desafiadora do que outros tipos de crise.
A PEC 23/2021 não resulta em nada de positivo para o país e para sua população.
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