O Julgamento do “Natal do Porta dos fundos” no STF. A questão da liberdade de expressão sob o prisma filosófico e democrático

O Julgamento do “Natal do Porta dos fundos” no STF. A questão da liberdade de expressão sob o prisma filosófico e democrático

No julgamento sobre o caso do “Natal do Porta dos fundos”, no STF, há uma possível controvérsia sobre se a liberdade de expressão é ilimitada e se é um direito absoluto.

Necessário fazer a seguinte distinção: a liberdade de expressão deve ser ilimitada com relação à divulgação, mas não pode ser absolutizada se comprovadamente causar danos. Se ela comporta reparos judiciais, em caso de excessos, já deixa de ser um direito absoluto.

A questão é a veiculação do pensamento, da livre expressão e propagação das ideias. O pensamento deve ser livre e divulgado mesmo que não se concorde com ele.

Como católico, posso até me ofender, mas como poderia proibir a circulação de um lixo cultural que em nada acarreta a minha fé e não representa o cristianismo?

Aqui existe uma confusão entre razão e vontade e, por isso mesmo, o conhecimento filosófico pode esclarecer essa dúvida.

A vontade que se tem de proibir ou impor limites colide com a racionalidade que julga e permite a liberdade.

Como ensina Tomás de Aquino, é pela Prudência, virtude racional da decisão certa, que se julga, não pela vontade da maioria ofendida.

Questão 47, artigo 6, parte final da Suma Teológica:

“É este o papel da prudência: aplicar os princípios universais às conclusões particulares no âmbito do agir. E, assim, não compete à prudência, indicar o fim das virtudes morais, mas somente lidar com os meios para atingir o fim”.

Dessa forma, liberdade de expressão, um princípio universal, é um meio para se obter virtudes morais.

Se a liberdade de expressão é mal usada e não busca as virtudes morais, um dos meios de corrigi-la é o jurídico. Jamais proibi-la, censurá-la.

Evocar número, no caso a ampla maioria cristã para declarar que o outro não pode se expressar é propagar uma espécie de democracia totalitária, coisa que já vem ocorrendo em outros países.

Os cristãos, por sua vez, em forma de associação, que se sentirem ofendidos talvez possam requerer a devida reparação por dano coletivo.

A Democracia é um processo e feita de riscos.

Um filme, até onde se sabe, é uma obra de arte.

A arte pode ser edificante, ruim, mentirosa, feia, imbecil, etc

Já tivemos diversos filmes ditos blasfemos, mas com qualidade artística, a exemplo de: “Je vous salue Marie” que foi inicialmente proibido, em 1986, pelo então presidente José Sarney, mas depois exibido, em 1988, sem nenhum problema e com uma ínfima plateia. É uma consequência lógica: sem polêmica e sem tentativa de proibição diminuem o público.

“A última tentação de Cristo” e “A vida de Brian”, também foram exibidos no Brasil e, apesar da celeuma, não houve censura e nem reparação de danos.

Um exemplo inglês:

O filme “A Vida de Brian”, por exemplo, foi objeto de intenso debate intelectual na Inglaterra, envolvendo católicos ilustres como Malcolm Muggeridge, mas nada de censura ou coisa parecida.

No Brasil, ainda que não tenha havido debate entre um grupo de cristãos e os produtores do filme, as ideias reproduzidas no filme foram amplamente repelidas e a qualidade artística discutida.

É assim o jogo democrático e a liminar pode ser confirmada no plenário do STF com o julgamento favorável à produtora “Porta dos fundos” e a liberdade de expressão.

Para ter acesso à decisão do Presidente do STF, clique aqui.

Para ler artigo com outro ponto de vista sobre a questão, clique aqui.

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Luís Fernando Pires Braga

Advogado.

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