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Lacordaire e o Único Presente de Natal que interessa…

Lacordaire e o Único Presente de Natal que interessa…

Um dos efeitos dessa pandemia foi aumentar o medo da morte. Paradoxalmente, fez também com que as pessoas desviassem o assunto dela e passassem a procurar mais divertimento, a aumentar as compras virtuais, a falar das medidas restritivas, da máscara, dos tratamentos, da vacinação, etc

A morte teve, outrossim, um viés estatístico reverencial. Todo dia se lembra o número de mortos e se faz uma reverência a ele. A cultura massificada da morte tem esse condão: transformar tantos mortos queridos e insubstituíveis em números. A grande mídia faz isso para provocar medo na população, não por respeito!

No entanto, a morte é pessoal, única e é o que mais angustia o ser humano. Essa condição angustiante produzida pela cessação da vida sempre foi assim e continuará a ser.

Lacordaire, intelectual francês e restaurador da Ordem dos Pregadores, no século XIX, fez uma célebre reflexão sobre essa angústia comum a todos os homens. Angústia essa que passa, sobretudo, pelo medo do nada e do esquecimento total. Seria algo como se o amor falhasse, não fosse suficiente e a existência uma mera passagem pela vida.

“Ainda que procuremos o amor durante toda a existência, não o atingiremos senão de uma maneira imperfeita, que nos faz sangrar o coração. E, se o obtivermos em vida, que nos sobrará dele após a morte? Uma oração amiga que nos acompanhe além da terra, uma lembrança piedosa que pronuncie ainda o nosso nome, mas, logo o céu e a terra avancem um passo, vem o esquecimento, o silêncio nos envolve, de plaga alguma sopra mais sobre a nossa sepultura a brisa etérea do amor. Tudo está acabado, acabado para sempre, e essa é a história do homem no amor”, escreveu Lacordaire.

Dentro dessa mesma reflexão, na própria feitura do texto, Lacordaire reconhece que errou. O amor, na verdade, não é algo fruto da imaginação, não é falível e a existência tem um sentido profundo. O amor é uma Pessoa e Essa Pessoa é o Único e Eterno Presente que realmente interessa ao ser humano.

Ele, então, continua:

“Engano-me, senhores, há um homem cujo túmulo é violado pelo amor, um homem cujo sepulcro não é apenas glorioso, como afirmou um profeta, mas amado. Um homem cujas cinzas, depois de dezoito séculos, ainda não arrefeceram; renasce cada dia no pensamento de uma multidão incalculável. Um homem morto e sepultado de quem se aguardam o sono e o despertar, de quem ressoa, ainda cada uma das palavras, gerando mais que o amor, gerando virtudes que frutificam no amor. Um homem acorrentado, há séculos, a um patíbulo, e esse homem, milhares de admiradores O desprendem cada dia do seu trono de suplício, dobram os joelhos diante dEle, prostram-se humildemente sem com isso se envergonharem, e aí, curvados, beijam-Lhe com um ardor indizível os pés ensanguentados. Um homem flagelado, morto, crucificado, que uma inenarrável paixão ressuscita da morte e da infâmia, para recolocá-Lo na glória de um amor que nunca desfalece, que encontra Nele a paz, a honra, a alegria e até o êxtase. Um homem perseguido, no seu suplício e no seu túmulo, por um ódio inextinguível, e que, convocando apóstolos e mártires em cada posteridade que surge, encontra apóstolos e mártires no seio de todas as gerações. Um homem enfim, e o único que tenha estabelecido seu amor sobre a Terra, e esse homem sois Vós, ó Jesus! Vós que houvestes por bem batizar-me, ungir-me, santificar-me em vosso amor e cujo nome, só ele, neste momento descerra as minhas entranhas e delas arranca esta linguagem que a mim mesmo perturba e de que eu próprio não me sabia capaz.”

Feliz Natal!

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Luís Fernando Pires Braga

Advogado.

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